A actuação do octogenário Rui Almeida no último Portugal tem Talento tem tanto de doce e amoroso como de tonto e deprimente. Em cada português há sempre um artista e um génio escondidos. Haja palco e oportunidade para o soltarmos, e aí vamos nós, achando que temos graça (normalmente, achamos sempre que temos mais graça do que realmente temos). Rui Almeida tem um fétiche: gosta de se vestir com os vestidos da sua "senhora". Em bom rigor, não há aqui nada de novo. Há muito homem por aí que tem o mesmo prazer. Acontece que Rui Almeida tem idade para sonhar, mas já não tem idade para vir à televisão mostrar-nos como se vestem os seus sonhos. É corajoso? É, claro. É ternurento? Claro que sim, ainda por cima quando o concorrente responde a um dos jurados que sabe que fica bem vestido de mulher, mas que a sua "senhora também fica bem, porque é muito linda".
O problema de conceitos abrangentes como os de Portugal tem Talento (que aqui elogiei há uma semana como programa de bom entretenimento - e não é isso que está em causa) é que cabe lá tudo. Até a comovente simplicidade deste lisboeta que, há dez anos, com uns amigos, experimentou roupas de mulher no Inatel de Monte Real. Juízo, juízo tem a mulher. Bem arranjadinha para vir à TV, confessa, com ar compungido, a Bárbara Guimarães: "Eu apoiar, apoio-o, mas não concordo". Há velhos hábitos culturais da nossa educação judaico-cristã que nem o mais popular concurso televisivo consegue abalar.
Os portugueses têm talento? Que tenham, que mostrem, que cantem, que dancem, que digam poesia, que façam mímica, mas poupem-nos a outras manifestações de arte. É que a televisão amplia o ridículo.
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