O Emmy obtido pela novela "Meu Amor" é a demonstração de que a ousadia compensa. Tenho repetidamente afirmado que ninguém nasce condenado a ser pequeno. Durante muitos anos, vigorou na Televisão, em Portugal, a ideia de que não havia capacidade para se ombrear com o que, no estrangeiro, se fazia em matéria de ficção. O primado avassalador das novelas da TV Globo contribuiu para que essa convicção adquirisse raízes, com a ajuda militante do imobilismo nacional e do deslumbramento causado por tudo que vinha do exterior. Sempre acreditei que, no nosso País, havia talento e capacidade técnica para se fazer mais e melhor do que aquilo que era produzido por estas paragens. A única forma de crescer e ganhar mercado seria tentar competir exactamente nos mesmos termos com quem nos dominava, inclusivé, com sobranceria.
"Todo o Tempo do Mundo" e "Jardins Proibidos" foram os primeiros passos de um percurso feito de aventura, entusiasmo e crença. Muitas boas vontades se congregaram para que um sonho se pudesse converter na realidade que agora internacionalmente se viu consagrada. Portugal dispõe hoje de uma indústria de produção ficcional para Televisão, com autores, actores, realizadores, cenógrafos e técnicos que, convenientemente orientados e dirigidos, podem materializar qualquer projecto, mesmo os mais ambiciosos. Independentemente das novelas, recordo aqui "A Jóia de África" e "Equador" como duas apostas que arrasaram com as velhas e tradicionais teorias, segundo as quais Portugal estaria vocacionado para pensar apenas em ponto pequeno. Como tudo na vida, é preciso acreditar, medindo cada opção, sopesando cada custo, ponderando cada alvo a alcançar.
Sempre encarei um projecto de ficção como um bébé que precisa de amparo sistemático e militante. O mínimo descuido, num país onde a má língua impera e a inveja faz ninho, pode revelar-se fatal para quem ganhou asas para voar. As sementes lançadas necessitam de rega permanente, para que os frutos nasçam e cresçam saudáveis, capazes mesmo de resistir à fúria de muito gestor insensível, limitado pela lógica dos números e sempre de tesoura ao alcance da mão, tacanhamente indisponível para entender a verdade do negócio e da sua reprodução.
O Emmy de "Meu Amor" é apenas uma etapa. Se houver coragem, determinação e o sonho que derruba barreiras muitas outras serão alcançadas, tal o volume de oportunidades que se abrem, mesmo no exterior. Com humildade e bom senso, neste período de crise e descrença, o audiovisual pode fornecer exemplos sobre formas de agir. Descansar à sombra das glórias alcançadas é o caminho certo para o insucesso. Os que fizeram "Meu Amor" estão de parabéns. Mas a globalidade dos autores, actores, técnicos e músicos que contribuiram para que uma indústria se conseguisse impor, com valores próprios e diferenciadores, também. Sem essa máquina instalada, no panorama, provavelmente, ainda predominaria a marca brasileira. Até para os mais novos. Nesse aspecto "Morangos com Açúcar", por exemplo, representa muito mais do que uma série que se mastiga como pastilha elástica. É um laboratório de talentos apontado ao futuro. Mesmo quando é tratado com menos cuidado do que merece.
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