30 de novembro de 2010

Fecho


Boa noite. O Fecho de hoje incluí uma crónica da autoria de Mário Contumélias, retirada do Jornal de Notícias.
Inimputáveis

"Condenados", o programa de Sofia Pinto Coelho que a SIC tem vindo a exibir, chegou ao fim. Foram quatro episódios, quatro casos de condenações mais que duvidosas, trazidos a lume por um trabalho de investigação jornalística irrepreensível, quer no plano técnico, quer no plano ético, como já aqui escrevi.


Sofia investigou sempre com rigor e isenção, e apresentou os resultados num formato personalizado em que é uma das protagonistas da história.

Formei-me profissionalmente num tempo em que se ensinava aos jornalistas que não devem aparecer porque o que importa é a notícia, de que são apenas mediadores. Contudo, vivemos num mundo diferente e o protagonismo, assumido por Sofia Pinto Coelho nas quatro reportagens, foi uma aposta ganha.


Permitiu aos telespectadores acompanhar, passo a passo, o seu pensamento, a racionalidade que norteou a investigação realizada. Portanto, puderam reflectir com ela, e assim melhor compreender a informação que lhes chegava. Outra coisa é o que nos fica, depois de vermos as quatro edições do programa.


Ou seja, a evidência de que a Justiça muitas vezes é cega porque alguns juízes não são capazes de ver como deviam, talvez porque alcançaram, entre nós, um imerecido estatuto de entronizados detentores da verdade. E assim, dispõem-se a dar credibilidade a vítimas que a não merecem; a desvalorizar testemunhos-chave; a ignorar alibis inatacáveis; a pôr para trás das costas incoerências óbvias; a fechar os olhos a irregularidades processuais; a decidir por convicção.

Justificam-se deste modo perguntas, como a feita em "Condenados", sobre "como é que três juízes condenam uma pessoa, sem provas?" Certo, certo é que um inocente pode ser acusado, preso, julgado e condenado. Tal e qual como mostrou, na quinta-feira, a TVI que aconteceu ao guineense Bacar Baldé, de 28 anos, condenado a três anos e meio de prisão por violação de uma menor, pelo tribunal de Vila Nova de Gaia, e que viu agora provada, por um teste de ADN, a sua inocência. Mais uma vez, um colectivo de juízes estava enganado.

Mas, quando o erro fica a descoberto, por raras que sejam as vezes em que isso acontece, os juízes responsáveis pelo erro judicial não acham razão para pedir desculpa, porque isso não está na nossa tradição e só se justificaria se os juízes tivessem agido de má fé. A não ser o caso, Suas Excelências são inimputáveis. E mesmo o Supremo Tribunal de Justiça, estatisticamente falando, só corrige um erro judicial, de dois em dois anos. Temos pois, boas razões para temer a Justiça. E se lhe comprassem uns óculos?

Nenhum comentário: